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A sobrevivência do seu negócio depende da igualdade

Na minha família, quando éramos crianças, meu pai dividia o futuro profissional dos filhos: O mais novo, interessado e hábil em matemática, ganharia dinheiro e sustentaria o mais velho, cujos interesses criativos não levariam a um futuro lucrativo.

A vida adulta chegou e, teimoso que sou, desenvolvi uma carreira em consultoria de negócios cujo job description intitulei “fazer as empresas ganharem mais dinheiro”.

Ao contrário das previsões escolares, minhas habilidades criativas me serviram na formulação de perguntas e interpretação de dados (embora minhas pobres habilidades matemáticas não tenham me colocado como responsável para extraí-los).

E minha sensibilidade me trouxe a capacidade de observar e escutar como estilo de liderança. Não por acaso, me envolvi com paixão no setor educacional, ora focado em novas metodologias de ensino para adultos frustrados, ora em programas de treinamento corporativo, trazendo as tais habilidades do século XXI.

Trazia comigo a idéia de que a educação está fundamentalmente quebrada, e não era só um problema das instituições escolares, mas um problema sistêmico de percepção de identidades e habilidades.

O que significava ser artístico, criativo e sensível e o que significava ser lógico, racional e estratégico? Em que momentos passamos a dividir as crianças em polaridades e por que parecia haver espaço no mundo para apenas um tipo de homem?

Mais tarde compreendi que a mesma dicotomia é o que impede meus clientes de avançar em seus projetos e intenções de transformação. Ora, se o mote do presente é a resiliência, como desenvolver profissionais proativos, intra-empreendedores, capazes de detectar e resolver problemas inéditos e complexos sem promover a integração de habilidades analíticas e criativas ao mesmo tempo? E como promover tal integração a partir de um design organizacional com papéis em caixinhas, que reforçam a cultura do “não é meu trabalho” ou ainda do “não sou bom nisso”?

Hoje, tenho a clareza e a convicção de que a visão binária do mundo é o principal desafio para a sobrevivência de um negócio. Quantos funcionários você já avaliou no automático, com base em um histórico de “este cara não funciona pra esse tipo de job”?

Quantas vezes ao longo da sua carreira você se sentiu injustiçado por uma liderança que não te deu espaço para trabalhar novas competências, testar outros desafios? Ou ainda, você já se sentiu prejudicado por ser taxado de tímido em relação a um colega “macho alfa” que exala características de “um líder nato”, nas palavras dos executivos?

Eu posso dizer que sim. Para dar um exemplo, lembro de uma situação em que fui chamado para fazer a gestão de crise em uma conta-chave. Cheguei na reunião com a apresentação que havia preparado sozinho, porém meu colega ‘escolhido’ e a cliente conversavam apenas entre eles, sem me direcionar as perguntas sobre os próprios dados que eu apresentava.

Em outras situações, pronto a dar palestras sobre pesquisas que havia feito, meu colega era selecionado com a justificativa de ser mais assertivo e extrovertido.

As crenças tradicionais sobre o que significa ser homem historicamente se concentraram em uma confiança estóica, desencorajando a expressão emocional. Em um estudo da Movember , 58% dos homens relataram que acham que a sociedade espera que sejam emocionalmente fortes e que não mostrem fraqueza diante dos outros.
https://www.forbes.com/sites/mindsharepartners/2019/11/12/the-changing-landscape-of-masculinity-and-mens-mental-health-in-the-workplace/#7b3bbf5ee685

Eu posso dizer que sim, mas não da maneira como você pensa. Se você chegou até aqui no texto, preciso confessar uma coisa: sou uma mulher.

Vou fazer uma pequena pausa para você reler.

O mindset fixo que afasta muitos homens de seu potencial de performance impede mulheres de conquistarem um lugar na mesa dos adultos. Embora a injustiça corra para todos os espectros de gênero, existe um agravante no caso do sexo feminino.

Estamos presas num loop de recomendações, similar aos algoritmos de streaming viciados, que tocam apenas os mesmos artistas.

Vou tentar resumir para quem ainda não entendeu do que estou falando: quanto menos mulheres em cargos de liderança, menos mulheres em cargos de liderança. As estatísticas são alarmantes:

Em 2019, nas empresas S&P500, apenas 30 possuem mulheres CEOs, um total de 6%. Em dezembro de 2018, a taxa de participação global das mulheres nos parlamentos em nível nacional é de 24,1%.

Em tempos do politicamente correto e do marketing de causa, mesmo nas empresas com estruturas organizacionais mais horizontais nota-se a predominância da voz masculina em tomadas de decisão e nas tentativas de meritocracia. Boa parte das vezes, mulheres são enquadradas em um pressuposto de skills, sem mesmo poder comprovar suas habilidades.

“We have research showing that women who believe math is an acquired set of skills, not a gift you have or don’t have, fare very well,”

É o caso, por exemplo, quando escuto “você é brilhante, gostamos do seu trabalho, mas para falar com este cliente, para dar essa palestra, para fazer essa entrevista, para assinar este artigo, achamos que pegaria melhor um homem”. Perdi a conta da quantidade de conteúdos e projetos que desenvolvi para serem apresentados por um colega — e não sou exceção para esta vivência.

A ascensão do assunto “cultura organizacional” trouxe consequências na pauta diversidade sem cruzá-la com a distribuição de cargos. Embora novas políticas de contratação estejam em voga, o gap de pagamento ainda é significativo e, pior do que ele, o gap de voz, gerando uma dinâmica perde-perde para colaboradoras e empresas.

Você não precisa ser feminista militante para entender do que falo. Já comentei em outro artigo sobre pesquisas que comprovam que a diversidade aumenta o desempenho das empresas. Imagine agora que, além de “contar cabeças” para um censo bonito nas suas políticas de RH, você destrave o potencial adormecido de toda uma população?

Imagine liderar um time a partir de suas competências reais e potenciais, sem pressupostos de julgamento? Além da política de contratação é urgente a revisão de metodologias de avaliação de performance e, acima disso, das próprias estruturas de governança.

O caminho não é simples e não vem sem risco. Por onde você pode começar? Uma sugestão, apenas uma sugestão, não utilize seu orçamento para uma comemoração de aparências no dia das mulheres. Reúna as representantes do gênero em sua empresa, poucas ou muitas, de todas as camadas, respire fundo e prepare-se para apenas escutar após uma humilde pergunta: Quero mudar. Por onde eu começo? Tenho certeza de que elas terão muito a dizer.

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